quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

A INFLUÊNCIA DA "MISSA" DE LUTERO NA ADORAÇÃO CONTEMPORÂNEA

Lutero pregando em uma "missa" no castelo de Wandburgo
No artigo anterior foi abordado sobre a nomenclatura usada por Lutero para o culto solene. Lutero manteve o termo missa, mas, com outra aplicação teológica. Enquanto a igreja católica romana entendia que a missa (a cerimônia cristã) tinha o efeito sacrificial e salvívico ( a missa só tinha validade quando presidida por um sacerdote romano e a ministração da eucaristia como dos outros sacramentos), Lutero repudiou este pensamento, mas manteve o termo “missa” quanto ao momento solene para a adoração. Antes de tudo, como já foi dito antes, Lutero resgatou a necessidade de centralizar a pregação da Palavra no culto, aboliu diversos elementos e símbolos que estavam fora dos padrões bíblicos e reformulou o modelo de liturgia para diversas igrejas espalhadas pela Alemanha e outras regiões da Europa.


Contudo, Lutero entendia que o propósito do culto não tinha apenas o seu aspecto objetivo, mas também subjetivo. O aspecto objetivo tinha como base a centralidade da pregação do evangelho. O aspecto subjetivo era o envolvimento de cada participante em corresponder com a mensagem da Palavra. Para Lutero o culto tinha como objetivo a comunhão dos fieis. Enquanto a igreja romana entendia que o culto tinha seu efeito sacrificial Lutero afirmava que o seu efeito espiritual estava na participação dos membros para responder a mensagem transmitida por Deus por meio de sua Palavra. O elemento cúltico que claramente expressava este conceito missal (ideia de celebração e comunhão) era a eucaristia que posteriormente foi renomeado pelos reformados de a ceia do Senhor.

Ainda quanto ao aspecto subjetivo, Lutero entendia que tudo quanto a Bíblia não proibia de forma direta como elementos, símbolos ou métodos aplicados ao culto poderiam ser usados desde que, fossem aplicados de forma apropriada, com reverência e sem contrariar os princípios fundamentais do evangelho. Desta forma, a “missa” (a celebração cristã que unem todos os cristãos solenemente a ter um encontro com Deus) tem como significado a comunhão.

Creio que outro ponto a ser destacado, é o fato de Lutero não ter abolido todos os ritos e objetos considerados sagrados. ainda se manteve a prática de acender velas, apesar da retirada das estatuas de santos e imagens da virgem Maria, ainda se manteve o altar adornado de velas a cruz e no lugar de algum santo, a Bíblia aberta em Romanos 1: 17. Os ministros luteranos até os dias de hoje ainda usam batinas e estolas que se assemelham aos dos sacerdotes romanistas. 

Quais considerações podem ser feitas em relação a este pensamento de Lutero? Em primeiro lugar, a sua influência teológica no meio evangélico em nossos dias. O aspecto teológico tem haver com o objetivo e motivação em se realizar o culto solene.

É comum nas igrejas, às pessoas argumentarem na mesma linha quanto ao objetivo do culto solene. As “celebrações” cristãs tem o fim de promover um encontro dos participantes com Deus por meio de todas as atividades e símbolos usados na adoração. Pensamentos como: “Eu preciso sentir a presença de Deus senão o culto não tem o seu efeito espiritual.” Veja ainda que, os mesmos acréscimos aberrantes inventados e admitidos pela igreja na idade média têm retornado ao meio evangélico de nossos dias. O culto só tinha efeito espiritual se o participante recebesse os sacramentos pela ministração e mediação do sacerdote romano.  

Em segundo lugar, temos a influência prática e histórica na forma como os evangélicos realizam seus cultos, ou seja, os métodos e os elementos aplicados ao culto. Creio que o pensamento de Lutero quanto ao propósito e motivação do culto não determinou precisamente o modo como as igrejas de nossos dias aplicassem corretamente os elementos e a forma bíblica de adoração a Deus. o pragmatismo e o pluralismo religioso influenciou fortemente o movimento evangélico dos nossos dias. A subjetividade, as experiências individuais e o emocionalismo tem tomado conta do interesse das pessoas em frequentar os cultos de suas respectivas igrejas.

Em geral, tem-se justificado certas práticas e elementos acrescidos ao culto na mesma linha de argumentação de Lutero: Se Deus em sua Palavra não proibiu de forma explicita tal elemento ou método então podemos usa-los para a adoração pública. De alguma forma, fazendo justiça ao pensamento de Lutero, em nenhum momento ele sugeriu um modelo de culto desorientado ou desordenado onde qualquer pessoa poderia fazer o que bem entendesse. Entretanto pode-se perceber a influencia teológica como prática de seu pensamento sobre adoração quando ele definiu o culto como sendo o ato de comungar, ou seja, o momento da missa.

Uma missa tecno dance luterana em
Estocolmo na Suécia
Entretanto, é preciso salientar que existe uma diferença muito grande em relação aos dias de Lutero e os nossos dias quanto a esta situação. Lutero estava reformando a igreja. Hoje, estão desviando a igreja. Lutero não admitia qualquer acréscimo ou prática litúrgica sem o crivo das Escrituras. Hoje, estão desprezando as Escrituras. Lutero entendia que o principal ato do culto era a pregação da Palavra. Hoje não existe mais pregação da Palavra em muitos cultos “evangélicos”.  

Qual a diferença de um culto “evangélico” acrescentar ritos sincréticos e místicos em relação à igreja romana que usava os mesmos artifícios derivados do paganismo oriental e ocidental do mundo antigo? Qual a diferença das igrejas “evangélicas” que admitem como elementos de culto as danças em vez da reverência diante de Deus, o palco em vez do púlpito, os talk shows, as profecias e revelações extras bíblicas em vez da fiel pregação da Palavra, uma tonelada de música para lavagem cerebral em vez de um culto consciente e racional, em relação às missas realizadas em latim, o conceito propiciatório nos sacramentos especialmente a eucaristia, as indulgências, o sacerdote como intercessor além de Cristo para expiação dos pecados, as bulas e encíclicas papais como autoridade revelacional e divina além das Escrituras?

Você vê alguma semelhança? Pois é, qualquer semelhança não é mera coincidência.  

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

PENSAMENTO DE LUTERO SOBRE ADORAÇÃO - I. A "MISSA" EVANGÉLICA

Creio que a pergunta em relação ao pensamento de Lutero sobre adoração é, Qual deveria ser a primeira mudança para estabelecer um modelo de culto fundamentado nas Escrituras? Logo de início, vejamos a nomenclatura usada para a adoração pública conforme o reformador. Em suas palavras, Lutero escreve ao seu amigo e colega de ministério Nicolau Hausmann, pastor da Igreja de Zwickau: Por isso, amado Nicolau, conforme pediste tantas vezes, queremos tratar de uma forma evangélica de celebrar a missa (como dizem) e de comungar (Martinho Lutero, Obras Selecionadas - Vol. 7, p. 156).


Comecemos pela nomenclatura usada por Lutero em relação a cerimônia cristã para adoração pública: Missa. Você possivelmente está perguntando: Mas, se Lutero manteve esta nomenclatura para designar a adoração pública na igreja houve alguma mudança significativa para um culto bíblico? Sim, mesmo que não pareça, houve mudanças significativas. Entretanto, é importante entender por que Lutero manteve o termo "missa".

Em Primeiro lugar, devemos lembrar que Lutero não desejava de imediato romper com a Igreja Católica Apostólica Romana. De início, sua preocupação era promover reforma religiosa em pontos fundamentais em questões doutrinárias e eclesiásticas. Tendo consciência de que suas publicações e posicionamentos teológicos provocariam toda a Europa seja do lado romanista como do que apoiaria a reforma, Lutero foi muito tímido e cauteloso, como ele mesmo disse em sua carta ao amigo Nicolau.

Em segundo lugar, não podemos descartar o contexto religioso e histórico em que Lutero estava inserido. O termo 'missa' do latim "missae", que significa; celebração e comunhão, fazia referência aos ritos cúlticos e as cerimônias da igreja romana. A missa (equivalente a culto) só tinha validade e efeito espiritual nos fieis se fosse celebrado os sacramentos especialmente a eucaristia. Lutero sendo de influência monástica (agostiniana) ainda era influenciado pelo espírito de sua época e desvincular-se repentinamente disso seria impossível. Era natural que o início da reforma fosse conduzido pela providência divina em mudanças essenciais, mas com um passo de cada vez ao longo dos anos.

Mas, como disse antes, houve mudanças significativas na forma de adoração. Lutero manteve o termo "missa" destacando o aspecto espiritual do culto público que, para ele, se dava na comunhão dos santos com o seu Deus por meio da pessoa e obra redentora de Cristo. Lutero, de imediato, aboliu da "missa" todos os ritos, símbolos, objetos, cantos, preces e rezas que fizessem alguma alusão direta ou indireta a missa como meio propiciatório, ou seja, por causa da ministração dos sacramentos a missa romana tinha o efeito salvívico nos fieis. Era o que Lutero e os cristãos de sua época diziam ser a missa sacrificial.

Ele mesmo disse:

"Por isso, confessamos em primeiro lugar que nem jamais foi nossa intenção abolir totalmente todo o culto a Deus, mas apenas purificar novamente esse que está em uso, mas que está viciado pelos piores acréscimos, e mostrar o uso evangélico. Pois, não podemos negar que a missa e a comunhão no pão e no vinho é um rito divinamente instituído por Cristo e que foi observado, primeiramente no tempo de Cristo e depois no tempo dos apóstolos, da forma mais simples e evangélica, sem qualquer acréscimo. No Entanto, no decorrer do tempo, foi ampliado por tantas invenções humana que, em nossos dias, além do nome da missa e da comunhão nada restou (Martinho Lutero, Obras Selecionadas - vol. 7, p. 157)." Neste aspecto, veja que Martinho Lutero estabeleceu o que podemos entender e como ele mesmo denominou a "missa" evangélica.

Todo cuidado é pouco quando julgamos os fatos que procederam a reforma com Lutero. De fato, o termo "missa" foi desvinculado pelos reformados especialmente João Calvino por uma questão muito simples e forte; a expressão missa está carregada e impregnada com os princípios e a tradição dogmática dos romanistas. Contudo, Lutero repudiou com todas as forças o conceito sacrificial e intercessório do clero como sendo o culto a Deus.

E
m suas palavras, ele condenou a missa romanista chamando-a de esfarrapado e abominável cânone de missa, coletado das fossas e cloacas do mundo inteiro. Ainda, nos mesmos escritos a Nicolau chama o clero da igreja romana de celibatários ricos, ociosos, poderosos, voluptuosos e imundos, como derradeira devastação (Martinho Lutero, Obras Selecionadas - vol. 7, p. 158). Concluo que mesmo sendo estas mudanças litúrgicas do culto mais lenta e menos agressiva, ainda sim, seria natural que Lutero desejasse a purificação da Igreja em vez de dividi-la.